Desde
o início da pandemia, presidente nunca tomou um posicionamento efetivo contra a
doença. Esse vírus trouxe uma certa histeria", afirmou o presidente, logo
após o Brasil registrar o primeiro óbito por covid-19.
Fernando
Crispim / Fotos Públicas
Desde
que a pandemia de covid-19 começou, matando centenas de pessoas
na China, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) já dava sinais de que a
negligência seria a tônica de sua conduta quando a doença chegasse no
Brasil. No dia 9 de março, ele afirmou a situação estava superdimensionada.
"Existe
o perigo, mas está havendo um superdimensionamento nesta questão. Nós não
podemos parar a economia. E eu tenho que dar o exemplo em todos os momentos. E
fui, realmente, apertei a mão de muita gente em frente ao Palácio, aqui na
Presidência da República, para demonstrar que estou com o povo." Dois dias
depois, a Organização Mundial da Saúde (OMS) decretou pandemia.
A primeira medida normativa para enfrentar o desafio do
coronavírus veio somente depois de dois meses e 11 dias após a
descoberta da nova doença pelos médicos na China. Foi no dia 11 de março,
quando o Ministério da Saúde publicou a portaria 356, tratando
do isolamento de pacientes, exames compulsórios e análises
laboratoriais.
DA “HISTERIA” À
“GRIPEZINHA”
A
postura do presidente também foi verbalizada quando três dias após o Brasil
registrar o primeiro óbito, no dia 17 de março, o presidente afirmou que
“depois da facada”, não seria uma “gripezinha” que iria derrubá-lo, novamente
minimizando o risco da doença. Pouco antes, Bolsonaro disse que
“obviamente temos no momento uma crise, uma pequena crise. No meu entender,
muito mais fantasia, a questão do coronavírus, que não é isso tudo que a grande
mídia propala ou propaga pelo mundo todo".
Em
17 de março, Bolsonaro disse que havia uma “histeria” em torno da crise
pandêmica e que comemoraria seu aniversário de 65 anos com uma “festinha
tradicional”, ofendendo todos os familiares brasileiros que perderam entes
queridos para a doença. "Esse vírus trouxe uma certa histeria. Tem alguns
governadores, no meu entender, posso até estar errado, que estão tomando
medidas que vão prejudicar e muito a nossa economia", declarou.
O
mesmo posicionamento ocorreu no dia 22 de março: quando o Brasil registrou
1.546 e 25 óbitos, Bolsonaro afirmou que o número de mortes por covid-19 não ultrapassaria a quantidade de vítimas fatais
causada por H1N1, que, segundo ele foram 800. A declaração, em
entrevista ao Domingo Espetacular, da TV Record, não especificava o período de
análise.
No
dia 8 de abril, duas semanas após a fala do presidente, o Brasil registrou 814
óbitos, ultrapassando o número estipulado por Bolsonaro. Ainda assim, dois dias
depois ele afirmou: “tá com medinho de pegar vírus? Tá de brincadeira. O vírus
é uma coisa que 60% vai ter ou 70%. Não vai fugir disso”. Até às 18h30 deste
sábado (1), foram 2.707.877 milhões de casos e 93.563 mortes, ultrapassando em
116 vezes o estipulado pelo presidente no início da pandemia.
Ainda
no começo de abril, um dia após o então ministro da Saúde, Luiz Henrique
Mandetta, defender a importância de medidas de isolamento para combater o
coronavírus, em rede nacional, em uma coletiva de imprensa, o presidente fez o
contrário: ignorou as recomendações do próprio ministro, bem como da OMS,
e visitou diversos comércios em Brasília, na manhã o dia 29 de
março. Em vídeos postados em suas redes sociais, é possível ver Bolsonaro
cercado de pessoas, causando expressivas aglomerações.
O
movimento continuou a ser o mesmo conforme o passar dos dias. Cerca de um mês
depois o presidente afirmou: “E daí? Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias,
mas não faço milagre”, em resposta à observação de um jornalista sobre a marca
de aproximadamente 5 mil mortes.
CLOROQUINA
Durante
toda a pandemia, Bolsonaro insistiu e ainda insiste na campanha pelo uso
indiscriminado da cloroquina, mesmo sem evidência científica provando eficácia
contra a covid-19. Ele chegou a defender o uso da medicação em rede nacional e
obrigou o Ministério da Saúde a incluí-la no tratamento de pacientes. Seu
esforço para propagandear se deu ainda quando ele contraiu o vírus. Mesmo ao
reconhecer que teve febre de 38 graus e dores no corpo, Bolsonaro tentou manter
a postura de que a covid-19, por mais que já tenha matado mais de 65 mil
brasileiros, não é tão grave assim.
A
OMS não recomenda que as substâncias sejam usadas para pacientes infectados
pelo coronavírus, a não ser em testes controlados, uma vez que podem ocorrer
efeitos colaterais cardíacos e outros como acidente vascular cerebral (AVC).
Em
Manaus, um estudo foi foi interrompido após a morte de pacientes que
receberam doses altas de cloroquina e a verificação de que a
substância - usada para tratar a malária e outra doenças autoimunes - causava
arritmia cardíaca em um número elevado de pessoas. Ainda assim, no dia 24 de
julho, o ministro interino da Saúde, Eduardo Pazuello, durante entrevista coletiva,
mostrou que o governo federal distribuiu 100.500 comprimidos de cloroquina para
indígenas.
Paralelamente,
Bolsonaro sancionou com 16 vetos a lei que cria o Plano Emergencial para Enfrentamento à Covid-19 nos territórios
indígenas, que estabelece medidas para prevenir a disseminação da doença
entre povos tradicionais.
Entre
os trechos vetados pelo presidente, estão a obrigação de o governo oferecer
acesso à água potável e a distribuição de produtos de higiene e limpeza.
Bolsonaro também vetou a elaboração de ações específicas para ampliar os leitos
hospitalares, a liberação de verba emergencial para a saúde indígena, projetos
de instalação de internet nas aldeias, distribuição de cestas básicas e o
acesso facilitado ao auxílio emergencial.
TROCA DE MINISTROS
Os
dois ministros da Saúde ligados diretamente à área, os médicos Luiz Henrique
Mandetta e Nelson Teich, não resistiram às ordens de Bolsonaro na pasta. Desde
o dia 15 de maio, quando Teich pediu demissão, o Brasil não tem um ministro da
Saúde. Quem está no cargo é o ministro interino e general Eduardo
Pazuello.
Mandetta
foi demitido em 16 de abril, após uma série de embates com o presidente sobre
isolamento social. Segundo o mandatário, o então ministro defendeu só o
interesse médico em meio à pandemia e "não entendeu a questão do
emprego". Teich não ficou nem um mês no cargo. Ele discordou de Bolsonaro
sobre o uso indiscriminado da cloroquina e, sem espaço para trabalhar, pediu
demissão em 15 de maio.
Dos
mais de R$ 500 bilhões liberados pelo Congresso para os gastos com a pandemia
no Brasil, o governo Bolsonaro executou apenas R$ 216 bilhões, que
correspondem a menos de 43% do total. A constatação é do Siga Brasil,
plataforma do Senado que acompanha o percurso de gastos da União.
Se
mantiver a curva de mortes por covid-19 dos últimos dias, o Brasil chegará a
100 mil mortes entre sexta-feira (7) e sábado (8).
Do
Brasil de Fato
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