A
única certeza é que , se a cabeça do bolsonarismo não for decepada agora, pelo
julgamento do Tribunal Superior Eleitoral, há o risco concreto de que, dentro
de algum tempo, a confluência de forças permitir a ele completar o golpe
militar que tentou há semanas contra o Supremo.
Mais
do que nunca, não dá para separar o cenário econômico do político.
No
quadro atual, há as seguintes variáveis influenciando o jogo político.
PEÇA 1 – O FATOR
BOLSONARO
Não
há a menor dúvida que, havendo condições objetivas, Bolsonaro dará o golpe. As
condições estão sendo preparadas da seguinte maneira:
Grupos militares –
Recente pesquisa publicada pela revista Piauí, em cima de perfis de policiais
militares nas redes sociais e em WhatsApp mostra um acirramento cada vez maior
do discurso de radicalização dos quadros bolsonaristas na base das policiais.
Se o WhtatsApp foi capaz de articular públicos difusos pelo país afora, mais
facilmente conseguirá ser instrumento de articulação de corporações militares,
Grupos paramilitares
– Continua entrando armamento abundante no país que vai para dois grupos
centrais de apoio a Bolsonaro: Clubes de Tiro e milícias. Reforça o que foi
manifestado pelos Bolsonaros desde os primeiros dias de governo: a defesa do
projeto Bolsonaro estará nas mãos dos seguidores armados e na cooptação dos
militares, através de emprego na máquina pública, assim como ocorreu na
Venezuela.
A renda básica –
embora a renda básica de R$ 600 tenha sido proporcionada pelo Congresso,
Bolsonaro percebeu seu potencial eleitoral e deverá avançar nessa direção. As
primeiras pesquisas mostram que está começando a romper a resistência das
classes de menor renda. É um passo que poderá moldar seu populismo de direita,
sobre o qual se falará mais adiante.
PEÇA 2 – O PACTO NACIONAL
O
aguardado pacto político nacional está longe ainda de se concretizar. Em parte
pela falta de lideranças aglutinadoras do centro-esquera e centro-direita. Há
um vácuo de interlocutores, mesmo ante a ameaça crescente de Bolsonaro liquidar
de vez com o que resta da democracia brasileira. E o ponto central é a barreira
entre grupos de centro-direita – representados pela mídia tradicional – e o
lulismo.
Uma
das maneiras de destravar esse impasse seria a votação pela suspeição do
ex-juiz Sérgio Moro, liberando Lula para reaglutinar as forças de
centro-esquerda.
Hoje
em dia, há um início de descongelamento nas relações mídia-lulismo, exposto em
editoriais endossando as acusações de suspeição de Moro, ou admitindo o voto do
STF nessa direção. É pouca coisa ainda, são apenas indícios, mas relevantes por
significar uma brecha no antilulismo arraigado dos grupos de mídia.
Para
o STF aceitar a suspeição de Moro, basta apenas vontade política, o endosso de
outras forças que participaram dos golpes institucionais dos últimos anos e a
constatação de que, sem retomar os valores da imparcialidade e da defesa
radical da Constituição e da democracia, o STF não resistirá aos avanços do
bolsonarismo.
PEÇA 3 – A SUSPEIÇÃO DE
SÉRGIO MORO
Todas
as acusações contra Lula se basearam em uma tramoia da seguinte ordem:
1.
Em qualquer parte do mundo, presidentes definem as estratégias econômicas e
políticas de um país.
2.
Essas estratégias gerais beneficiam grupos específicos. A guerra contra o
Iraque, por exemplo, beneficiou empreiteiras americanas ligadas a políticos
influentes. Antes, a guerra fria beneficiou o complexo industrial-militar. As
políticas de desregulação da era Clinton beneficiaram o setor financeiro, assim
como as de Fernando Henrique Cardoso no Brasil. As políticas de campeões
nacionais de Lula beneficiaram as empreiteiras e fabricantes de proteína
animal.
3.
Os setores beneficiados têm interesse em manter a influência política dos
presidentes, mesmo após o final de seu mandato. E a maneira de isso ocorrer é
através do financiamento de suas fundações ou de mimos aos presidentes. Pode
configurar falhas éticas, mas jamais crimes. Para haver crime, a contribuição
tem que estar associada a um benefício direto recebido pelo doador.
A
Lava Jato – com a complacência geral da mídia e dos tribunais superiores –
cometeu duas desonestidades processuais óbvias:
1. Criou a figura da
lavagem de apartamento.
Não
encontrou nenhum documento que mostrasse que Lula tinha a propriedade do
triplex e do sítio de Atibaia. Criou, então, essa excrescência jurídica da
“lavagem de apartamento”. “Lavagem de dinheiro” consiste em esconder a propriedade
de dinheiro em contas offshores, em nome de “laranjas”. A lavagem se dá com os
chamados “bens fungíveis”, isto é, que podem ser trocados em qualquer parte do
mundo. Dinheiro é bem fungível, assim como obras de arte.
No
caso do triplex, a propriedade continuava sendo da OAS, a empresa construtora.
No caso do sítio, dos Bittar, conforme comprovado no contrato de compra e na
demonstração do pagamento.
Conclusão
da Lava Jato: ao não passar o certificado de propriedade para Lula, a OAS
estava lavando o apartamento para ele. Trata-se de uma conclusão aceita pelo
TRF4 que desmoraliza o direito penal brasileiro no mundo.
2. Criou vínculos
artificiais com contratos.
A
segunda manobra foi pressionar delatores a criar vínculos entre contratos
obtidos no governo Lula e os mimos oferecidos pelas empreiteiras, como a
reforma do sítio para usufruto de Lula.
A
maneira como a Lava Jato forçou esses vínculos se constituem em uma mancha na
história jurídica do país – por ter sido coonestada por tribunais superiores.
Jogou executivos na cadeia e apresentou como alternativa para sua libertação
uma declaração qualquer afirmando que houve a barganha entre uma obra
específica (que custou pouco mais de um milhão) e contratos (na casa dos
bilhões).
Lula
continuou sendo uma personalidade relevante para as empreiteiras brasileiras,
tanto na África quanto em outros países da América Latina. Apoiar o Instituto
Lula era relevante para os planos de negócio das empreiteiras, dentro da
diplomacia comercial brasileira. Prova maior foi um e-mail de um
executivo da Odebrecht sugerindo que, em uma viagem a país da América Central,
Lula desse uma força para a empresa, que tinha planos de entrar na região. Era
a prova maior do interesse da Odebrecht na influência política de Lula. Mas
tratou-se o e-mail como escândalo.
Ao
sair da presidência da República, a primeira palestra paga de FHC foi para a
Ambev, pelo cachê de US$ 250 mil. Bastaria torturar um delator e afirmar que
foi pagamento pela aprovação da compra da Brahma pela Ambev, alguns anos antes,
para condenar FHC.
PEÇA 4 – O FATOR LULA
É
possível que, finalmente, o STF corrija essas aberrações. Do lado da mídia, já
há sinais de apoio ao restabelecimento dos princípios jurídicos e do fim da
perseguição a Lula, em editoriais, matérias de colunistas. Mesmo porque, essa
lógica canhestra está se voltando contra seus próprios aliados políticos. E a
ameaça à democracia deixou de ser as fantasias em torno das FARCs para se
transformar em ameaça concreta, das milícias bolsonaristas.
O
desimpedimento de Lula poderia ser relevante para a montagem do pacto nacional.
Embora
alguns analistas insistam em analisar o potencial político de Lula, a
possibilidade de uma candidatura Lula é remota. O antilulismo, plantado em anos
de discurso de ódio, continua sendo uma força relevante junto à classe média. E
o avanço de Bolsonaro sobre a renda básica poderá reduzir parte da base
eleitoral lulista nas classes de menor renda.
Mesmo
assim, a expectativa de uma mudança no status político de Lula poderá acelerar
contatos com forças de centro, visando a constituição do aguardado Pacto de
Moncloa nacional.
PEÇA 5 – O FATOR CAMPEÃO
BRANCO
Por
trás de toda essa movimentação está a incapacidade de se gerar um candidato de
proveta de centro. E, cada vez mais, Sérgio Moro está sendo visto em sua
verdadeira dimensão: um político menor, de província, mas com enorme potencial
de tentar recriar o autoritarismo bolsonarista, no caso de esvaziamento do
bolsonarismo histriônico atual.
A
fantasia Luciano Huck, submetido a um curso de madureza política, se dilui
quando a pandemia mostra a dimensão dos desafios que vêm pela frente. E, a cada
dia que passa, o poder de influência da mídia vai se tornando menor, quadro
agravado pela crise econômica inédita, similar à de 1999.
Daí
a necessidade imperiosa do descongelamento das relações com o centro-esquerda,
dentro de uma estratégia de detente que permita salvar a democracia brasileira.
PEÇA 6 – BOLSONARO E O
POPULISMO DE DIREITA
Todos
esses movimentos poderão ser inúteis se Bolsonaro pegar a embocadura política.
A estratégia que se delineia é a seguinte:
1.
Bolsonaro fecha a boca e substitui as conclamações à sua base por políticas
sociais concretas, como a tal renda básica. Enquanto isto, usa as redes de
WhatsApp para mobilizar suas milícias para a guerra.
2.
Assim como entendeu a utilidade eleitoral da renda básica, acabará substituindo
a fantasias das reformas de Guedes, por injeção na veia dos gastos públicos
visando reativar a economia. A premência política ajudará a sepultar o
terraplanismo ideológico de Guedes.
Até
agora todos apostaram na imbecilidade flagrante do bolsonarismo. Mas até os
imbecis aprendem, ainda que ao custo de mais de 100 mil mortes. E, com as
esperanças nacionais na lona, qualquer respiro de esperança terá efeito
eleitoral fulminante. Casará o discurso moralista, preconceituoso, de ódio,
como o da esperança de superação da crise que ele mesmo engendrou.
PEÇA 7 – UM CENÁRIO
INCONCLUSIVO
É
tal a quantidade de variáveis em jogo, de tendências não definidas, que se
torna impossível um cenário claro pela frente – ainda que amarrado em variações
de probabilidade.
A
única certeza é que , se a cabeça do bolsonarismo não for decepada agora, pelo
julgamento do Tribunal Superior Eleitoral, há o risco concreto de que, dentro
de algum tempo, a confluência de forças permitir a ele completar o golpe
militar que tentou há semanas contra o Supremo.
Do
GGN
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