Os
brasileiros vão se transformar em juristas mais uma vez com o duelo de Gilmar
Mendes com os militares. Os ministros fardados pretendem enquadrar o ministro
do STF pela acusação de que as Forças Armadas são cúmplices do genocídio da
pandemia.
Mendes
entende que, por terem um general (Eduardo Pazuello) no Ministério da Saúde,
passam a compartilhar com Bolsonaro todas as consequências por erros e delitos
do governo.
Os
militares não gostaram da acusação de que se associaram a um genocídio. E, em nota
que largaram hoje, 13, fazem questão de dizer:
“Genocídio
é definido por lei como a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo
nacional, étnico, racial ou religioso” (Lei no 2.889/1956). Trata-se de um
crime gravíssimo, tanto no âmbito nacional, como na justiça internacional, o
que, naturalmente, é de pleno conhecimento de um jurista”.
E
esta é a declaração de Mendes, dita num debate promovido sábado pela revista
IstoÉ, ao comentar as omissões do governo no combate à pandemia e o fato de que
Eduardo Pazuello é o ministro interino da Saúde:
“Isso
é péssimo para a imagem das Forças Armadas. É preciso dizer isso de maneira
muito clara: o Exército está se associando a esse genocídio, não é razoável. É
preciso pôr fim a isso”.
O
imbróglio é complicado para Gilmar Mendes. O ministro pode ter caído numa
arapuca. Ele já processou a atriz Monica Iozzi exatamente pela acusação de
cumplicidade com crimes comprovados.
Em
outubro de 2016, Monica publicou uma foto de Mendes no Instagram, com uma
palavra e uma interrogação (“Cúmplice?”), mais essa legenda: “Gilmar Mendes
concedeu habeas corpus para Roger Abdelmassih, depois de sua
condenação a 278 anos de prisão por 58 estupros”.
O
ministro, que havia libertado o médico, processou a atriz. Pediu uma
indenização de R$ 100 mil e levou R$ 30 mil, depois de um acordo.
A
sentença saiu em maio de 2017. É da 4ª Vara Cível de Brasília e foi expedida
pelo juiz Giordano Resende Costa. Concordando com Gilmar Mendes, o juiz
entendeu que Monica feriu a honra e a imagem do ministro.
O
juiz afirmou que Monica “extrapolou os limites de seu direito de expressão”, ao
criticar a decisão de Mendes, acusado de crimes de estupro e manipulação
genética. Mendes, segundo o juiz, acabava sendo apontado por cumplicidade com
os crimes.
Os
militares poderão dizer agora que Mendes os acusa de cumplicidade com o grave
crime de genocídio.
Mas
também aqui há uma armadilha, desta vez para os militares. Gilmar Mendes
recusou-se a ser acusado de cúmplice dos crimes cometidos pelo médico. Só que
os crimes de fato existiram.
Os
militares, ao se recusarem a ser cúmplices de genocídio, não admitem que o
governo Bolsonaro promove o extermínio de negros e pobres, que são, pelas
estatísticas, as maiores vítimas da pandemia?
O
genocídio não seria reconhecido como fato? E os militares não podem ser
associados a um crime que não existe? Ou o genocídio, para os militares, existe
mesmo, mas mesmo assim eles fazem a defesa de um governo cujo líder conspira
até contra o uso de máscaras?
Os
militares estão defendendo as omissões de Bolsonaro e a matança da pandemia,
que Gilmar Mendes preferiu chamar de genocídio, sem nenhuma originalidade?
Complicou-se
a situação de Gilmar Mendes. Mas a situação dos generais aliados de Bolsonaro e
da sua política de omissão diante da pandemia talvez seja ainda mais
complicada.
Enquanto
a controvérsia jurídica avança, a única verdade inquestionável é que continua o
genocídio denunciado pelo ministro do Supremo e pelas torcidas do Fluminense,
do Corinthians, do Botafogo, do Bahia, do Internacional, do Grêmio, do
Palmeiras…
De
modo que o formalismo fático que deu razão a Gilmar perante o juízo no caso
concreto, pode com as futuras condenações do governo Bolsonaro pelo malsucedido
enfrentamento da pandemia, ser a arapuca do próprio Mendes com a conversão disso em fatos criminosos. Vez que a Iozzi não exagerou, nem tampouco Mendes no caso dos
militares. O que pesou para a atriz foi o compadrio judicialesco.
(Acrescentamos).
Do
DCM
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