No
dia 24 de novembro de 2016, The Washington Post publicou uma reportagem de capa
sobre a interferência russa na eleição de Donald Trump. Essa reportagem
deflagrou a campanha mundial contra o fake news, apontado a partir de então,
com evidente exagero, como a maior ameaça à democracia. E, provavelmente, foi o
maior fake news das últimas décadas.
PEÇA 1 – O GOVERNO TEMER
E OS EUA
As
notícias de que a Apex (Agência Brasileira de Promoção das Exportações) rompeu
contrato com a Atlantic Council – por ver seu braço nas recentes decisões do
Facebook em bloquear as contas ligadas aos Bolsonaro – jogo foco sobre um
escritório de lobby que teve papel central nas articulações entre Lava Jato e o
Departamento de Estado norte-americano. E lança mais um pouco de luz sobre as
relações do governo Temer com a contraparte americana.
Mal
consumado o impeachment, alguns movimentos significativos do grupo de Temer –
constituído por Eduardo Cunha, Geddel Vieira Lima, Eliseu Padilha, José Serra e
Aloysio Nunes, entre outros.
Aloysio
foi enviado a Washington, Reuniu-se com o presidente e um membro do Comitê de
Relações Internacionais do Senado, Bob Corker (republicano, do estado do
Tennessee) e Ben Cardin (democrata, do estado de Maryland), e com o
Subsecretário de Estado e ex-Embaixador no Brasil, Thomas Shannon.
Compareceu
também a um almoço promovido por uma empresa de lobby, a Albright
Stonebridge Group, comandada pela ex-Secretária de Estado de Clinton, Madeleine
Albright e pelo ex-Secretário de Comércio de Bush e ex-diretor-executivo da
empresa Kellogg, Carlos Gutierrez.
Por
seu lado, à medida em que se aproximava o afastamento de Dilma Rousseff, Serra
empreendeu uma corrida para se tornar padrinho da mudança na Lei da Partilha –
o butim mais cobiçado pelos políticos. Ele, de um lado, Eduardo Cunha do outro,
acelerando a aprovação.
José
Serra apresenta PSL 4567/2016 no dia 25.02.2016. Senado
aprova nova lei do pré-sal em 24.02.2016, do Senador José Serra, para
tramitar em regime de urgência. Dia 12.05.2016, Senado aprova início do
processo de impeachment. E aí entra o fator Atlantic Council.
PEÇA 2 – O ACORDO COM O
ATLANTIC COUNCIL
Atlantic
Council é um centro de lobby nos Estados Unidos, cuja maior especialização é
fazer o meio campo entre executivos de empresas, potentados de países com
problemas de imagem, com funcionários públicos, especialmente do Departamento
de Justiça e do Departamento de Estado.
Clicando
aqui, você vai a uma reportagem do The New York Times sobre o uso abusivo
pelos think tanks de um falso conhecimento técnico para impor aos
governos decisões de interesse de seus contratantes. E um trecho especial sobre
as jogadas do Atlantic Council.
Assim
que explodiu a Lava Jato, o Atlantic Council se tornou uma das vitrines de
juízes e procuradores junto ao público corporativo norte-americano, exibindo-os
como troféus. Nomeou o ex-Procurador Geral da República Rodrigo Janot como
conselheiro, em um caso clássico de fake reputation, e promoveu
encontros com membros do Departamento de Justiça, no qual um deles, Kenneth
Blanco, narrou a maneira como o DoJ (o Departamento de Justiça) articulou-se
informalmente com o grupo de Curitiba para preparar a Lava Jato.
Agora,
pelas revelações dos últimos dias, o governo Temer tratou de cooptar o apoio da
instituição, com esse contrato assinado pela Apex.
PEÇA 3 – A SEGURANÇA
INTERNACIONAL E OS “ATORES MALIGNOS”
Harlam
Ulmann é um pensador da área de defesa que, desde os atentados às Torres
Gêmeas, passou a desenvolver um novo tipo de doutrina da segurança, fundada nos
seguintes valores.
A
revolução da informação e das comunicações globais instantâneas estão
frustrando a nova ordem mundial”
Apenas
um outro cataclismo como o 11/9 permitirá que o estado possa reafirmar o seu
domínio e a eliminação de agentes não estatais e indivíduos capacitados, a fim
de preservar a nova ordem mundial.
A
definição de uma “nova ordem mundial” deve ser a de uma tecnocracia mundial
gerida por uma fusão do grande governo e o grande negócio em que a
individualidade seja substituída por uma singularidade trans-humanista.
Não
são as superpotências militares, como a China, mas “atores não estatais”, como
Edward Snowden, Bradley Manning e hackers anônimos, que representam a maior
ameaça para o Westphalian System, porque eles estão incentivando as pessoas a
se tornarem autocapacitadas e eviscerar o controle do Estado.
Com
base nos estudos de Ulmann, o principal produto que o Atlantic Council
passou a vender foi a grande batalha da globalização através das redes sociais.
E a preparar estratégias que livrassem seus clientes das denúncias que
escapavam ao controle dos grupos de mídia
Mas
como impedir o acesso à rede daqueles que o Atlantic
Council denomina de “atores malignos”, disputando a narrativa com o
sistema, confrontando a ideologia da globalização? Como domar as redes sociais,
se a universalização do acesso está no cerne do seu modelo de negócio?
A
maneira como o Atlantic Council conseguiu dobrar o gigante Facebook é um caso
que ainda será contado, um dia, como um clássico do uso dos fake news, o
11 de novembro das redes sociais, preconizado pelo guru Ullman.
Aqui, você
tem a matéria que o GGN publicou há anos, contando essa história.
PEÇA 4 – O JOGO COM O
FACEBOOK
Conforme
relatamos em 18 de junho de 2018. No dia
24 de novembro de 2016, The Washington Post publicou uma reportagem de
capa sobre a interferência russa na eleição de Donald Trump. Essa reportagem
deflagrou a campanha mundial contra o fake news, apontado a partir de
então, com evidente exagero, como a maior ameaça à democracia. E,
provavelmente, foi o maior fake news das últimas décadas.
A
reportagem se baseava em um
site obscuro, o PropOrNot, cujos autores eram anônimos. O grupo divulgou um
relatório de 32 páginas detalhando a metodologia, e delatando cerca de duzentos
meios de comunicação suspeitos de publicar propaganda russa para torpedear a
campanha de Hillary Clinton. E justificava o anonimato pelo receio de ser
atacado pelos hackers russos.
Era
uma reportagem fantasiosa que não foi levada a sério por nenhum jornal. Por
alguma razão, o The Washington Post, comprou a versão, Adrian Chen, do
respeitado The
New Yorker, informou que havia sido contatado pela organização mas não embarcou
na história.
“Um
olhar mais atento no relatório mostrou que estava uma bagunça. “Para ser
honesto, parece uma tentativa muito amadora”, disse-me Eliot Higgins, um
pesquisador respeitado que investigou notícias falsas da Rússia em seu site,
Bellingcat, durante anos. “Eu acho que nunca deveria ter sido publicado em
qualquer site de notícias de qualquer nota.”
O
Washington Post foi obrigado a se retratar. Na cabeça de reportagem online
publicou numa Nota do Editor dizendo não garantir a validade das conclusões do
PorpOrNot. Nem tinha condições de avaliar se a campanha russa havia sido
decisiva para eleger Trump.
Um
deles se valeu de análise linguística. Concluiu que o autor anônimo era Michael
Weiss, editor sênior do The Daily Beast , colunista de Política
Externa e colaborador frequente em segurança nacional
da CNN . Ele também é editor-chefe do The
Interpreter , membro sênior não-residente do Atlantic Council e
co-presidente do Russia Studies Center da Henry Jackson Society.
Outro
pesquisador se valeu de uma ferramenta de teste, que permite a varredura de
vulnerabilidades em sites. Mostrou que o painel de administração
pertencia a www.interpretermag.com,
site financiado pelo Atlantic Council.
A
divulgação das matérias colocou Mark Zuckerberg de joelhos ante o Congresso
americano. Fio intimado a comparecer a uma audiência onde foi jogado contra a
parede. Sua reação imediata foi contratar o Atlantic Council para assessorá-lo.
O
caminho, segundo o Atlantic Council, seria estabelecer “parcerias com
organizações de checagem de fatos, reprimindo propagandas de sites não confiáveis,
modificando seus algoritmos”. Mas apenas isso, mas essas organizações “lançando
seus próprios projetos de suporte de mídia”. Espalha-se, aí, o fenômeno das
agências de checagem.
E
paro por aqui, sem maiores informações ou deduções sobre a ofensiva do Facebook
contra a rede de ódio dos Bolsonaro.
Do
GGN
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